Durante séculos e séculos as mulheres vem sendo violentadas, sem
perspectiva de mudança. Guardando para si a vergonha e indignação
pelo que aconteceu, suplicando para que não estivessem grávidas ou
contraído alguma doença. Nada a fazer em relação aos ferozes e
massacrantes danos psíquicos. Sobraria continuar em suas tarefas
subalternas, enfrentando opressões, assédio moral em todos espaços
de vida, desde a família. Talvez alentando a esperança de que o
tempo se encarregue de que esqueçam essa dolorosa ferida aberta para
a eternidade. Esta situação é praticamente a mesma hoje, para
grande parte das mulheres violentadas, especialmente as que são
estupradas e pobres. O silêncio, as ameaças, a ausência de
respaldo por políticas públicas específicas, especialmente em
Estados como MT, que pela precariedade dessas ações, elas mesmas
são estimuladas, acobertando (in)diretamente estes crimes. É
preciso denunciar e pressionar por uma política consequente que
articule esforços em vários níveis governamentais (saúde,
educação, assistência social e judiciária, reparações, com
acolhimento integral). As mulheres, adolescentes e crianças
vitimadas não podem ser deixadas no ostracismo, discriminadas
triplamente na privação de seus direitos. É preciso romper com
esta situação onde prepondera a ocultação, a invisibilidade e a
impunidade. A violência contra as mulheres é uma força bruta que
coloca a diferença entre sexos no campo das desigualdades. Homens
castigam as mulheres como se fosse natural, ao seu bel prazer,
acreditando que são criaturas subordinadas ao seu poder de donos da
vida e do corpo da outra (sejam casados, namorados, “companheiros”,
desconhecidos, parentes). É preciso também entender que o
enfrentamento da violência contra a mulher não se reduz a punição
do agressor no âmbito policial e judiciário. É mais amplo,
necessário chegar ao núcleo dos problemas, extrapolando o ato de
violência como ação de descontrole, anormalidade psíquica,
drogas, onde a vítima é tida como incapaz e passiva. A produção
social da violência ancora-se em determinantes sociais que exigem a
presença de um Estado consequente, ampliado, não maniqueísta. Que
ofereça e implemente políticas amplas, intersetoriais e integrais
para os desafios deste urgente dever público. Desse passivo
arrasador e vergonhoso que a sociedade tem que superar contra as
práticas do machismo e do patriarcalismo. Neste sentido, é preciso
chegar à uma reparação à vítima, e até a possibilidade de
reabilitação social do agressor, além do momento crucial da sua
punição. Temos que sair deste roteiro sinistro, que culpa
grosseiramente (ou sutilmente) a própria vítima. Na justiça, são
abjetas, ridículas e cafajestes as perguntas da maioria dos
advogados de estupradores. Na falta de consistência, “rolam” o
processo na tentativa de produzir testemunhas. Conforme o
comprometimento do juiz(a) e promotor(a) com a ética social da
justiça, esses argumentos estarão desqualificados. A violência do
estupro, suas consequências, não se acabam com nenhum curativo,
sutura ou técnica de esquecimento. A justiça pode ser um elemento
de punição e reparação na histórias das vítimas do estupro.
Roubam brutalmente das vítimas, sua essência corporal, seu
território mágico e sagrado. Tentam detonar com a fimbria ancestral
do desejo, esta eterna chama do viver e amar verdadeiramente.
Waldir
Bertúlio
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