quinta-feira, 30 de abril de 2015

De Gambiarras ao Planejamento Urbano I

Precisamos de um Planejamento Urbano para nossas cidades, tendo clareza de que o mesmo não pode se constituir em uma panaceia. Não há varinha mágica para resolver os estrangulamentos, os enormes problemas e desafios para estabelecer os rumos pertinentes para chegarmos a ser uma cidade saudável. O Planejamento Urbano é um instrumento para conhecer e estabelecer ordenamento nas formas adequadas e compatíveis com as demandas e necessidades de uma ou mais cidades. Tem enorme contribuição e validade para estabelecer parâmetros e critérios para a ocupação urbana em busca da melhor qualidade de vida da população. Se Cuiabá já tem desafios difíceis de transpor, pelo legado extenso de verdadeiras gambiarras urbanas, imaginem em Várzea Grande. Cidade há longo tempo abandonada a sua própria sorte. Ou azar, se considerarmos as chances que teve para ter uma boa infraestrutura e aparelhamentos socioculturais. Simplesmente, teve dois governadores, mandatos de deputado estadual, federal e senadores. A cidade nunca foi pensada com mínima seriedade em sua organização espacial, senão como mercado de expansão mercadológica, imobiliária e de interesses financeiros, que raramente retornaram para construir o conforto urbano nesta cidade. Teve tanto tempo como segundo orçamento municipal em Mato Grosso, e proporcionalmente deficitária nos investimentos estruturais e sociais para a cidade. Posou por tempos como uma “cidade industrial” sem   que se pudesse ver o retorno de investimentos em benefício da cidade. Onde ficou o interesse e a visibilidade de gestores e políticos para que se tornasse de fato uma cidade confortável para viver? Impostos não serviram para melhoria da cidade?  Governanças, via de regra, atabalhoadas e de interesses deslocados dos investimentos necessários na malha urbana.  Voltados para interesses de pequenos grupos e chefes políticos locupletando-se do poder e da coisa pública. A gambiarra política e de gestão é sempre fazer de conta que fazem, iludindo a população em práticas absolutamente clientelistas e patrimonialistas. Enredados no conservadorismos e atraso, sob os auspícios e legado do regime de exceção. Devemos esperar que com a modificação da composição populacional, esta estrutura de poder político pode perder sua hegemonia (como já vem acontecendo). Para tal, é necessário uma verdadeira varredura nas lideranças antigas e até recentes, que insistem nos descaminhos que trouxeram Várzea Grande a um patamar de ser das piores cidades em conforto para se viver em Mato Grosso. Se trabalharmos indicadores em políticas sociais como saúde, educação, infraestrutura, comparando com sua renda histórica, seu desempenho cai a níveis bastante inferiores a cidades muito menos desenvolvidas. Nem se fala em reurbanização, em planos diretores elaborados com o rigor e diagnostico necessário. Raríssimas praças, áreas de lazer, sem ruas e calçadas arejadas, sem centros culturais e de lazer, pouco para esportes. Sem ciclovias, nem mesmo na própria Avenida da FEB. Sistemas de dejetos líquidos e sólidos praticamente ausentes, ainda se falando hoje no superado e proibido “lixão”. Poluição hídrica, sonora, visual e aniquilamento da perspectiva e necessidade de amplos aparelhos sociais. Transporte coletivo uma lastima. A cidade segue ao “léu”, como se fosse realmente uma cidade dormitório, distanciando abissalmente da sua memória social. A imobilidade e o atraso são impostos por maioria de gestões públicas e Legislativos distantes de honrar a representação concedida pelos eleitores (as). Como nestas condições falar em atrair projetos de renda e emprego? Várzea Grande ainda pode ser salva, se pelo menos acompanhar os ventos de mudança contra o patrimonialismo operados até agora pelo novo governo instalado no Palácio Paiaguás, operando uma ética de gestão na contramão de maior parte da cultura institucional desviante e intransparente acumulada em MT. É necessário drástica mudança política. Vamos esperar até quando?

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Urbe Violentada

foto extraída do site g1.com
Em minhas reminiscências sobre Cuiabá, alegrias de infância e adolescência em uma cidade acolhedora, tranquila e conectada visceralmente com a natureza. Quando retornava de férias estudando “fora”, primeira coisa no reencontro fora de casa era ir curtir o belo centro velho,  mergulhar nas águas do Cuiabá, Ribeirão e Coxipó. Sempre foi fascinante palmilhar com os pés e perscrutar com os olhos aquela arquitetura bela nas estreitas ruas de paralelepípedos. Ali, porões soturnos, como a bafejar o grito de dor e indignação de escravos e índios, brutalizados pela insaciável violência da ocupação armada e sanha pela fortuna fácil do ouro abundante. As Lavras do Sutil foram vertentes de dor e lágrimas das vítimas, negros e índios, estes últimos que até então aqui viviam neste território, felizes e livres. É alto o preço deste progresso, distante de um marco civilizatório. No processo histórico desta cidade, idas e vindas, contenda que desagua por uma cidade saudável, frente a cidade imaginada que a gente quer de melhor para viver. Nestes tempos, mais do que antes, é preciso superar o ufanismo e cair na realidade que temos a nossa frente. Fica para trás tudo o que não lutamos que poderia ter sido feito para que tivéssemos uma cidade melhor. Afinal, qual cidade queremos? – Qual progresso? Certamente não é este, que vem se apresentando no empobrecimento da paisagem e do cotidiano urbano. Em uma cultura política que acumulou a prática da gestão pública como sinônimo de burocracia perversa e corrupta. Aí está recente o tal legado das obras da copa, acompanhado por legados malditos em profusão. Que nos joga para baixo, rumo a imobilidade urbana. Em uma cidade onde os aparelhos públicos coletivos foram historicamente menosprezados. Ruas poeirentas, esburacadas, esgotos a céu aberto, asfaltos esburacados, consertos com remendos passageiros, sinalizações péssimas, pedestres, ciclistas e transporte coletivo em planos inferiores. Calçadas irregulares, verdadeiras armadilhas. Transportes frágeis, ônibus capengas. Quase nada é cumprido, desde a qualidade dos veículos até os horários e que linhas passam por ali, e outros como a falta de refrigeração nos ônibus. Legislativos e órgãos de fiscalização e controle ao largo da possibilidade de intervenções para o bem coletivo. Sistema de esgotos precaríssimos, coleta e disposição final de lixo insuficiente, poluição de córregos e rios, mau cheiro por todo lado. Quase toda sujeira da cidade no difícil escoamento de águas vão para córregos já mortos, caindo nos rios Cuiabá e Coxipó. Ou ficando nos ajuntamentos de lixo por toda periferia da cidade. O mercado imobiliário faz o que quer, com poucas intervenções e se restringem ao Ministério Público. Criam-se condomínios e núcleos urbanos sem a infraestrutura necessária e adequada, desde o sistema de dejetos e transporte urbano. O problema do lixo urbano é um assunto sério a ser resolvido na dimensão que hoje se apresenta. Reservas ambientais urbanas, raríssimas e ameaçadas. Nenhum incentivo para criação de novas reservas e parques, aliás seria fácil incentivar reservas particulares urbanas. Territórios como o centro velho e outras referências históricas de Cuiabá, esvaziados pela primazia dos “chopins”, bandeira do mercado elitista. A modernidade é componente da necessária diversidade, é preciso sustentar os marcos culturais da cidade, com sua verdadeira revitalização. Revitalizar seria recompor o conteúdo, a estética da cidade para uma vivencia agradável nos variados territórios que demarcam o pertencimento e orgulho do lugar.  A poluição visual e sonora campeiam pela cidade. A falta de uso da inteligência e a morosidade na reorganização da cidade é gritante. Parece que é uma série de “puxadinhos”, gambiarras e um grotesco e anômalo progresso sem imaginário e memória social. Apesar de ocorrerem algumas melhorias na cidade, é de boa noticia a recriação de um órgão de Planejamento Urbano. Sem um órgão desta natureza, politicamente forte e com recursos para sua operacionalização, não chegaremos a nenhum avanço qualitativo. Quais os cenários para o presente e futuro da nossa cidade? Qual a participação decisória real da sociedade? Até os 300 anos é possível demonstrar por onde e como caminhar rumo a cidade que queremos. É preciso superar as gambiarras urbanas da nossa Urbe Querida.

Memórias: transformar presente e futuro.





“Cai a tarde feito um
viaduto/E um bêbado travando luto/Me lembrou Carlitos/A lua tal qual a dona do
bordel/Pedia a cada estrela fria/Um brilho de aluguel/E nuvens, lá no mata
borrão do céu/Chupava manchas torturadas, que sufoco/Louco, o bêbado com chapéu
coco/Fazia reverencias mil/Pra noite do Brasil, meu Brasil/Que sonha com a
volta do irmão do Henfil/Com tanta gente que partiu/Num rabo de foguete/Chora
nossa pátria mãe gentil/Choram Marias e Clarices/Num solo do Brasil/Mas sei que
uma dor assim pungente/ não há de ser inutilmente a esperança/ Dança na corda
bamba de sombrinha/Em cada passo dessa linha/pode se machucar/Azar, a esperança
equilibrista/Sabe que o show de todo artista/Tem que continuar.”.
Este poema de João Bosco
e Aldir Blanc, “O Bêbado e o Equilibrista” remarca a fimbria de brasilidade,
resistência, indignação, nas condições mais desfavoráveis. O grito de esperança,
e uma melodia que expressa a vontade de mudança verdadeira.


Hoje fazem 51 anos do
golpe civil-militar de 1964. Exílio, cassações, torturas, assassinatos,
perseguição de todos que enfrentassem e lutassem pela redemocratização do país.
Estou em Porto Alegre, como membro da Comissão da Verdade dos docentes das Universidades
(ANDES-SN) e da Comissão Nacional da Verdade da Reforma Sanitária. Muitas
representações densas e significativas, agora já com a rede da Comissão da
Verdade das Universidades. Aqui, terra de João Goulart, derrubado e cassado
como o foram Leonel Brizola, Celso Furtado, Miguel Arraes, Luis Carlos Prestes,
Jânio Quadros e tantos outros. A junta militar assume, em 15 de abril, Castelo
Branco formaliza a trajetória da institucionalização da violência. Tanques,
baionetas, militarização do enfrentamento a tudo que se movia contra a
ditadura. Aqui, correm longos depoimentos impressionantes e candentes, por
instituições da maior integridade e relevância social. Saúdam a todos que
lutaram contra o estado de exceção. É muito pesado e amplo o legado da ditadura
em nosso país. Exemplo, o ovo da serpente no conduio das empreiteiras, o
financiamento privado com recursos público, muitas são as mesmas hoje, em
promiscuidade do setor público com o privado e uma imensidão de condições
desviantes, como a concentração da mídia no Brasil. O legado da violência
policial vem de lá. A violência ambiental e genocídio de populações indígenas,
autóctones e de periferias. Segundo o ex-presidente Médici, tido como o mais sanguinário
ditador do regime civil-militar, “índios são soldados natos, e a aldeia é um
quartel”. Deste lá, tratados como população transitória, que deve acabar. É
incrível a semelhança e coincidências com hoje. De lá vem as bases da
corrupção, impunidade e violência urbana e rural. Os estrategistas da ditadura
não tinham certeza que os governos de 2002 até agora surgissem para tocar seus
projetos. Hoje, a corrupção está naturalizada. Médici, dizia que “o homem não
foi feito para a democracia”. – quando proibiu falar sobre racismo, índios,
esquadrão da morte e temas proibidos para o regime. Tenho vergonha da estátua
do Médici na saída de Cuiabá para São Paulo, e no colégio na beira da Avenida
MT. Temos que lutar pela punição dos que cometeram crimes durante a ditadura
civil-militar. O caminho da verdade é muito longo. É preciso rever a lei de
anistia. Passar rigorosamente a limpo o passado é promessa de presente e
futuro.

Ditadura Nunca Mais

Foto extraída do site: lounge.obviousmag.org

Afinal, as manifestações  de volta á ditadura, muito polemizada,  inexpressivas  até pela quantidade tão pequena de saudosistas chamados então de ultradireita. Até mesmo estes “gatos pingados” sabem o que é voltar ao inferno, à violência de ferozes matizes e a desativação dos princípios democráticos. A impunidade e a injustiça em todos os níveis. Essas vontades sempre existiram, muitas vezes expressadas, como nas últimas passeatas, na pluralidade das manifestações. Em maio passado acompanhei de longe  um ato deste tipo na Praça da República em SP. Pouquíssima gente, como sempre, saudosos da ditadura no país. Nestes tempos, a mídia governamental valoriza estas manifestações como instrumento de defesa frente à avalanche das pressões do povo pela aprofundada crise política e econômica no país, tentando obscurecer as demandas legítimas que são colocadas. O canto poético do saudoso Gonzaguinha expressa o horror à ditadura: “São tantas lutas inglórias/são histórias que a história/qualquer dia contará/de obscuros personagens/as passagens, as coragens/são sementes espalhadas neste chão/de juvenais e Raimundos/tantos Julios de Santana/uma crença num enorme coração/dos humilhados e ofendidos/explorados e oprimidos/que tentaram encontrar a solução/são cruzes sem nomes, sem corpos, sem datas/Memórias de um tempo onde lutar por seu direito/É um defeito que mata.” O seguinte: querer a volta da ditadura, aí sim, é um golpe, mesmo que de carona em protestos com causas legítimas. Também pedir nas ruas o Impeachment da Presidente não faz de ninguém um(a) golpista. Exercem o legítimo direito de se manifestar, concordemos ou não. Em muitos países de melhor perspectiva democrática, impedimento é uma demanda legítima para governantes que cometem desde crimes de responsabilidade. Daí para chamar um golpe militar, à distância é enorme, inconsequente e absurda. Em pesquisa efetuada em Curitiba/PR, 84,76% são contrários. Medidas extremas não encontram espaço na sociedade, ainda que conservadora, a maioria é a favor do regime democrático. A segmentação da sociedade expõe as diferentes visões políticas, mesmo as superminoritárias. Interessante é que no ato pró-governo (13/03) conduzido pelo PT e seus aliados do movimento social, a Paraná pesquisas mostrou 17% de participantes favoráveis ao Impeachment. Apontou 37,16% indicando responsabilidade da Presidente pela crise econômica no país. Pelo levantamento no dia 13/03, foram oitocentas pessoas em apoio á Dilma e a Petrobrás. Já no dia 15 de Março, foram 80 mil pessoas, sendo que 89,52% dos participantes continuarão indo aos futuros protestos. Nestes atos de março, a volta a ditadura foi amplamente rejeitada. Esses resultados são compatíveis com os de SP, RJ e outras grandes capitais. Em Cuiabá foi muito expressiva a participação nos atos contra a Presidente Dilma, e minúsculo no que fui observar na Av. Getúlio Vargas a manifestação pró Dilma. -Corrupção na Assembleia Legislativa: em Curitiba, o trabalho investigativo de jornalistas da Gazeta do Povo e da RPCTV levou dois anos desvendando o escândalo chamado “Diários Secretos”. Esquema criminoso na AL do Paraná para desvio de dinheiro via contratação de funcionários fantasmas e laranjas. Desdobraram-se processos de improbidade administrativa, formação de quadrilha, peculato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Infelizmente aqui em MT ainda não foi feito um trabalho rigoroso de  investigação na gestão da Assembléia Legislativa. Por enquanto, só fumaça esparsa. O avanço do combate a corrupção é elemento de legitimação dos novos atores do Governo. E de parlamentares? Esperar para ver.