sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Retomada da Política cultural I.

A  luta por uma política cultural aqui em MT vem sendo desenvolvida e estimulada desde o preparo de proposições que antecederam a primeira Conferencia Estadual e Nacional de Cultura. Foram desenvolvidas discussões das diretrizes  políticas e operacionais para concepção e formulação de uma política cultural e respectivo plano. Este marco de trabalho coletivo com os atores da  cultura engendrou uma proposta conceitual participativa nos moldes do que fora conduzido na construção do SUS. As diretrizes  convergiram para acesso, participação / controle social, descentralização. Foi  fundamental para  isto o papel do Fórum Estadual de Cultura como um espaço autônomo de representação dos  vários segmentos culturais, já efervescentes  desde a década de 90. OO acumulado de uma proposta conceitual avançou, a ponto de propostas eixo oriundas das  contribuições de MT serem incorporadas nos debates e plenárias da Conferência Nacional de Cultura,  devidamente credenciadas na Conferência Estadual. Desde o início defendemos o orçamento do setor oriundo do orçamento fiscal. Nada de colocar nas mãos de empresas o destino das renúncias fiscais (dinheiro de imposto é nosso), que acolheriam, na maioria, tendencialmente, projetos de  interesses mercadológicos e excludentes. O que foi possível fazer, enquanto política pública e ação governamental foi o advento de leis para renúncia fiscal como aqui de MT e a nível nacional, com as limitações que conhecemos. A gestão pública nunca permitiu a possibilidade efetiva de seleção e distribuição necessária e justa dos  recursos, em  um princípio essencial para nossa  realidade, que  é a equidade (dar mais a quem tem menos). Não bastando isto, o discricionarismo e o clientelismo, também na esfera  da política de cultura, senão, os próprios desvios financeiros, correntes em nosso Estado. Apesar de insignificante o orçamento, também vai e vem, a malversação dos parcos recursos da Cultura, mantida a “ pão e água”, e frequentemente dada de consolo a grupos políticos.  Esforços e agendas de melhorias ocorreram pouquíssimas vezes pontualmente, o que ocorreu muito foi a incúria e o desprezo a uma política setorial colocada de lado das prioridades governamentais. Nestes novos tempos assistimos pela primeira vez um candidato a governador discutir abertamente com os atores da cultura  os rumos e prioridades de uma política cultural. Escolheu um Secretário legitimado pela sua seriedade  e inserção no espaço da cultura e das artes. Implanta o pensamento e a prática deixada de lado na formulação e implementação da Política Estadual de Cultura. Caracteriza o setor como singular dentro das políticas públicas , argumentando consistentemente com o Executivo uma autocrítica ao retorno institucional da Secretaria de Cultura, extinta no início da gestão, a contragosto  dos protagonistas da cultura. A proposta da Política e Plano Estadual que foi para aprovação na Ass. Legislativa   propunha também o aumento do financiamento no setor.  A demanda  dos setores da cultura é que chegue em um melhor momento, no mínimo a  1% do   orçamento  estadual.  Trata—se de acumular forças para que, no campo da autonomia, constituam—se  em atores sociais, cuja característica neste caso, é do reconhecimento pelas autoridades públicas como mediadores das demandas sociais, legitimados como   representação social. Especialmente, sobre a realidade do setor. Quando mergulhamos na luta pelo SUS desde a década de  80, o Movimento Sanitário  fala  no Partido da Saúde. Não precisamos de panfletarismo para a prática de um Partido da Cultura, como semântica e metáfora que luta  e também saúda os avanços e a reconstrução de competências na  cobrança e diálogo autônomo das representações sociais  com os governos. Claro, quando se abrem para dialogar não só com seus quadros, mas também com os oponentes. Assim, o tal Partido da Cultura pode ser uma instituição subjetiva que enfrenta, luta e acolhe todos esforços  e saúda os avanços.. A Secretaria de Cultura está avançando e   alimentando muitas das nossas acalentadas expectativas. Até onde vai, depende  de nós. Sem esperança, luta e utopia, a alienação e a inconsequência tomam conta....

A Passagem de um ícone - Gegé de Oyá

Habita outro plano, Gegé de Oyá. Você, figura proeminente em nossa sociedade, que sonhou com uma família, achando força na espiritualidade e na contenda com os reflexos da escravidão e na sua ancestralidade. Esta que foi tão dura aqui na baixada cuiabana, e que levou negros a serem jogados tal qual buchas de canhões ao morticínio da Guerra do Paraguai, com a promessa de libertação. Você, que condoía com o sofrimento da escravidão negra nas minas do Sutil. Como primeiro colunista social da nossa cidade, saudado e bajulado pelas elites da terra na fotogenia narcísica dos demandantes no desfile das colunas sociais. Mais do que isto, guia espiritual até de curas, de reencontros, de amores clandestinos guardados a chaves possíveis nas intempéries das falsas e reais relações amorosas, que levou tantos para terreiros, a conhecer um pouco da crença na religiosidade afro. Que construiu em terreno fértil a poética da resistência, do enfrentamento ostensivo das diferenças, do conservadorismo e da intolerância. Enfrentou de peito aberto, nunca recuando no orgulho à dignidade e na conquista dos seus desejos. Menino que nasceu na síndrome da fome, no velho sertão de Rosário Oeste. Acolhido e apoiado em pequeno, pela família Cuiabano. Que foi estudar Artes e Ofícios desde o primário no Colégio São Gonçalo, já encantado com a arte da costura, que continuou na antiga Escola Artífice. Gegé sempre se postou como um príncipe negro, incorporando como marca em seu talento, criatividade, a estética e o vestuário afro. Estudou, pesquisou, desde os trabalhos como alfaiate (dizia costureiro), até a de colunista social badalado nas hostes ditas “chiques”. Nunca deixou de lado as referências das famílias pobres e tradicionais em seus textos. Sobretudo, sarcástico com as incoerências das superficialidades que marcam um tipo de colunismo servil, mercantil e vazio. Tinha uma visão crítica sensata e 'finória' da alta sociedade, sabendo que acumulou poder e força através deste ofício, vendo isto como um instrumento de resistência em sua ligação sincrética com o catolicismo e a religiosidade afro. Foi amigo desde Dom Aquino, outras referências católicas em Cuiabá, até os núcleos de Candomblé, Umbanda e Espiritismo. Referências como Dandi, Pai Edésio, Joãozinho do Axé, Jojô, Robson e Seo Arlindo. Certa feita, em Brasília (levado por Isabel Campos, amizade forte), foi recepcionado com honras de Chefe de Estado, confundido com o Rei da Nigéria, que ainda não tinha chegado. Sua indumentária afro era componente da sua arte e estética. Carnavalesco, sua presença era marcante, o povo aplaudia em delírios, as crianças adoravam suas performances nos velhos carnavais e batalhas de rua. Assinava ponto nas madrugadas em bares e espaços como Choppão e Sayonara, passando por clubes como Operário, o Dandi, Náutico, Grêmio Antonio João, além dos clubes Feminino e Dom Bosco. Sua entrada foi vetada no Dom Bosco em uma comitiva dirigida pelo saudoso Mestre Batista, que culminou com contendas e o encerramento da festa naquela noite. Quando podia, “dava bananas” ao racismo e machismo da cidade, com o desprezo e elegância de sempre, ele, que enfrentou centenas de hostilidades deswta natureza.Também produziu na rádio Difusora o programa denominado “ Uma Rosa para uma Dama Triste”. Gegé de Oyá foi fortemente identitário, píoneiro e verdadeiro no seu pertencimento cultural, racial, no gênero e na orientação sexual. Em tempos dificílimos. Sempre ancorado na religiosidade e no sincretismo. Gegé de Oyá é história, memória e orgulho da nossa terra!


Waldir Bertúlio

Política e Descrédito

Preocupa-me muito saber qual o projeto para o país daqueles entes políticos que confiaram em acordos torpes com o Presidente da Câmara, tal qual fez o Governo e suas lideranças para tentar salvar a furibunda Presidente. Tão interessados estavam, que o PSOL e REDE que tomaram de fato iniciativa no processo que hoje comprime especialmente o Governo e a base aliada. Fizeram jogo de corpo mole o tempo todo na tentativa de assegurar o “apoio” de Eduardo Cunha para encaminhar o impeachment ou não acatá-lo. O PSDB ficou ao sabor das ondas, esperando e confiando na corte ao presidente da Câmara, que ao mesmo tempo era objeto de negociações em favor da Presidente, especialmente a si próprio, para escapar da cassação. Nesse sentido, também a oposição que confiou na negociata com o Presidente da Câmara, sofreu desmoralização, na medida em que perdeu todos os momentos de se colocar firmemente na pauta política que atormenta o país. O Brasil demorará por certo, muito mais tempo para sair desta crise que alarga seus horizontes, arrastando manifestos opositores também nas torrentes do descrédito. Por quê?- Postaram-se de maneira oportunista para conseguir seus intentos confiando em um personagem rigorosamente desqualificado para conduzir qualquer medida séria na câmara Federal.  Presidindo o Senado, outra figura que já escapou da cassação por artimanhas, envolvido como o Presidente da Câmara em sérias investigações sobre corrupção que estão vindo a tona, graças a operação Lava Jato. A crise política é devastadora, não se tratando apenas da economia do país, aproximando-se o momento potencial de colocar a vista o ex-Presidente Lula da Silva. Varre o país o aumento do desemprego, inflação, cortes profundos em políticas sociais estratégicas, redução dos investimentos, queda das exportações, inflação, alta de juros, carestia, prolongando além de 2016. Temos que lutar contra a possibilidade da “depressão”, agravamento socioeconômico que vêm após um período maior de recessão. A gravidade amplia quando enxergamos que não temos nada a vista de melhoria em um futuro próximo, a não ser a incerteza no quadro sócio-político. aqui no Brasil, os bancos ganham na crise, pois tem menor risco em operações com o setor público, alimentando o rentismo, agiotagem, no conluio da apropriação privada do setor público. Ainda pesam acusações sobre a campanha de 2014. Lembre-mo-nos do esquema PC Farias/Collor. Foi o tesoureiro da campanha, sendo assassinado sem nenhuma investigação rigorosa, como foi o caso de Celso Daniel. Provavelmente, se houvesse delação premiada e juízes como Sérgio Moro naquela época, Collor poderia estar “mofando” na cadeia até hoje. O partido do Governo tem dois ex-tesoureiros e ex-Presidentes do partido presos. Ainda pesam acusações sobre FHC, de que a sua reeleição teria sido comprada no Congresso. A defesa da Presidente, é que a mesma não pode ser objeto de impedimento “só porque teve avaliação negativa de popularidade”, muito s questionamentos da falta de motivos sólidos vieram, mas os argumentos são específicos e claros. Admissibilidade ou não do impeachment tem causas jurídicas, pressão da oposição, e de segmentos expressivos da sociedade. As tais “pedaladas fiscais” por exemplo, são instrumentos evidentes de maquiação das contas públicas. Apontam para a violação da Constituição Federal. além disso, edição de decretos não nomeados, sem comprovação de compatibilidade com metas fiscais. Aí, a lei de responsabilidade fiscal é uma faca de dois gumes. Nesta trajetória, não pediu autorização ao Parlamento, abrindo créditos fictícios sem previsão orçamentária através de decretos publicados no diário oficial em 2015. As pedaladas vinham configurar-se como empréstimos ilegais, tanto que, o grande esforço atual é pagá-las.  A União contratou o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal para operar o Bolsa Família e o projeto Minha Casa Minha Vida com repasses mensais. As transferências não foram efetuadas entre 2011 e 2014, mas estes efetuaram os pagamentos, configurando assim segundo autores do processo, verdadeiras operações de crédito. Apesar de que a Lei de Responsabilidade Fiscal seja draconiana, ela proíbe essas operações com instituições financeiras estatais. Quais penalidades? No artigo segundo da Lei de Impeachment, perda de cargo por cinco anos em qualquer função pública, em casos de crimes por responsabilidade. Onde está previsto isto? Na Lei 1079/50 (Impeachment). Diz que infligir a lei orçamentária, ordenar ou outorgar abertura de crédito sem autorização do Senado, sem fundamento na Lei orçamentária ou de crédito adicional sem prescrição legal. A lei diz que é crime contra a guarda e o legal emprego do dinheiro público abertura de crédito sem apoiar em formalidades legais,  empréstimos, emitir moeda corrente ou apólices. Esta pendenga que abre este difícil ano na politica brasileira. Tem muita surpresa ainda sobre a corrupção em nosso país. O povo continuara pagando para ver, ou irá protagonizar novos e melhores tempos?

Ceia pra Quem?

Em “Conto de Natal”, uma das principais obras de Charles Dickens, ele trata do tema central que move sua literatura, a injustiça. Certamente este tema é dos mais candentes e angustiantes na história da humanidade. Suas obras refletiram sua história de vida. Tido como um dos maiores romancistas da Europa, passou pelos dramas da pobreza e da injustiça social. Na literatura Brasileira temos produções de muitos bons autores, que conduzem suas reflexões em um grito contra a injustiça e o sofrimento humano. O sofrimento e a desigualdade como uma forma suprema de aprendizado. O Natal para mim sempre foi uma forma de reflexões e reminiscências; de lembranças, de tristezas; de espírito lúdico e pungente. Nos tempos em que o mercado não se apropriou desta data, guardo lembranças do meu povo, que vivia no Acuri, N. S. DO Livramento,  na beira do Rio Bento Gomes até Morrinho em Barão de Melgaço. Passávamos longas férias na infância e juventude, no Natal era festa, rodas de Cururu com cantadores entoando músicas de louvação. Desfilando as passagens bíblicas e A SABENÇA da vida cotidiana das comunidades do rio abaixo e rio acima. Viviam em fartura, de alimentos e de alegria. A história não e diferente, como milhares de outros, expulsos de suas terras na diáspora interna da baixada cuiabana, (e em todo MT), vindo constituir a horda de deserdados e injustiçados nas cidades, especialmente Várzea Grande e Cuiabá. Os sem escola, sem saúde, sem emprego, sem teto, espalhados no mal estar da sobrevivência e indignidade em nossa cidade resistiram e resistem bravamente, submetidos a condições extremamente desfavoráveis, mas refazendo e mantendo seus marcos culturais. São atores de antes, de agora e do futuro, na escalada da pobreza, das injustiças sociais, em um modelo de desenvolvimento extremamente concentrador e excludente. Frente a opulência dos que usam o poder para locupletação, intensificação e perpetuação das profundas diferenças sociais para viver, e até para morrer. Do outro lado, o outro povo, a outra cidade, onde poderosos enriquecem as custas dos outros, avareza e prepotência orientam o distanciamento cada vez maior entre os deserdados da terra e dos bens que produzem, e as castas que dominam as riquezas produzidas em nossa terra. Vivemos de fato um tempo sombrio, não de frescor, mas de agruras, com matilhas de hienas e lobos ferozes e insensíveis fazendo escárnio e zombando das desgraças perpetradas contra as manadas de gente indefesa. Por que se calam os que tem possibilidade de reagir a este Estado de coisas? Porque o pensamento hedonista predomina, ao sabor de viver o prazer acima de tudo, sem ética, como poder a qualquer preço? Ou o niilismo, onde são rompidos quaisquer vínculos com o coletivo, vivendo fechados em si. Por que não acreditar em nada, aos que podem contribuir com mudanças em busca da dignidade na vida de todos, sem exceção? Parece que há mesmo uma espécie de tetralogia niilista no hedonismo/consumismo; permissividade/relatividade, em um discurso fugaz do que é efêmero, volátil e inconsequente. Parece que vínculos sociais, afetivos, amorosos, são colocados como mínima perspectiva humana, há uma dúvida entre a inutilidade da existência e a busca de sentidos na vida? No hedonismo não há ideais, não há sonhos. É triste ver desde levas de jovens a adultos substituindo a perspectiva da liberdade pelo consumismo, pela falta de perspectiva, de futuro. Levas de gente parecendo querer fugir de si próprios. O consumo nessa sociedade mercadológica demanda para a crença na substituição de desejos por objetos frutos das tecnologias, onde a oferta da propaganda e uma ordem implícita. O relativismo hedonista demanda para o pior, a neutralidade, coisas como “eu não tenho nada a ver com isso”, apesar da barbárie e da violência. Não há preocupação com os sentidos da vida nem com a justiça, tão amorfos que nem são abordados pelos dramas existenciais. Claro, como se preocuparão com dramas sociais , grandes e pulsantes temas como a liberdade e a busca da verdade? Precisamos sair dessas bolhas malditas, encarar  a alteridade, colocar-se no lugar dos outros/as, é essencial para começar enfrentar e romper a ‘política do pão e circo’ que assistimos hoje em nosso país. Neste Natal, como o ano todo, levas de gente estão passando fome. De comida, de amor e esperança.