A crise financeira global é prolongada, a sua dimensão apontando
inequivocamente sua ancoragem estrutural. O receituário programado pelo Banco
Central Europeu (BCE) e FMI tem um caráter imediatista e recorrente, centrado
no ajuste fiscal. Uma das consequências é o aumento do desemprego com redução
dos direitos trabalhistas e previdenciários. Na América Latina alguns países
tentam intervir com mero assistencialismo para lidar com essa crise. No caso
brasileiro, isto é efetuado como método de distribuição de renda. O que faz, na
verdade, é consolidar maiores desigualdades sociais, com o rastilho do
desemprego. Transfere renda, por exemplo, nos impostos ao consumo, sem mexer
nos problemas estruturais, em um nivelamento por baixo. Ocorre ostensivamente
uma enorme de capital. Na Venezuela, que tem no petróleo sua base econômica,
apesar de nacionalizado, enfrenta crise de custos e endividamento, vez que é
dependente de todos acordos com os monopólios internacionais na bacia do rio
Orinoco. No Paraguai, o presidente Lugo foi derrubado por seus proprios aliados
políticos. Alianças com os grandes capitais locais e as velhas oligarquias
políticas sem limites (como está fazendo o governo petista
no Brasil). Nestas circunstâncias, voltou ao poder o Partido Colorado, que
reinou no país por 35 anos sob violenta ditadura. As intenções reformistas no
Paraguai foram “águas abaixo”. Neste episodio, cobraram de Cristina Kirchner e
Dilma Roussef apoio (contra a derrubada de Lugo) só no verniz, pois impossível
quando protegem em seus países os mesmos interesses econômicos que controlam ou
querem controlar das commodities (soja) até o subsolo das terras indígenas. A
imprensa independente do Cone Sul mostrou que a companhia Rio Tinto, empresa
canadense de mineraç ão, esteve por
trás do golpe. O Brasil, junto com a Argentina, em uma ação semi-colonial,
beneficiam-se da expropriação energética (Itaipú/Yaciretá), com os preços
determinados pelo mercado internacional, além do controle que exercem sobre a
exportação da soja paraguaia, protegendo monopolios nacionais e internacionais.
Neste macro-contexto de conjuntura internacional, nada difícil para detectar
este receituário da gestão pública, especialmente macro-econômica e
jurídico-política aqui no Brasil. A situação brasileira está bem distante de
uma calmaria, apesar dos discursos oficiais tentando esconder as contradições
da nossa realidade social, política e econômica. Na verdade, os governos Lula
da Silva e Dilma Roussef consolidaram uma agenda neo-desenvolvimentista
conservadora, ainda responsabilizando a tal herança maldita herdada do governo
FHC, dela se apropriando, assumindo e aprofundando todo o eixo dos projetos e intervenções
governamentais do governo anterior (maioria dos projetos receberam verniz com a
troca de nome). O crescimento do PIB em 2013, em franca desasceleração com a
queda do setor de serviços e intermediação financeira na briga pela queda de
juros, aponta que a euforia econômica governamental antecendente era só “fogo
de palha”. As instituições públicas de financiamento saltaram de 36,8% para
46,6%, tendo o ministro Guido Mantega anunciado a liberação de R$ 100 bilhões
para o BNDES para 2013, dos quais R$ 45 bi sairão do tesouro nacional. O Banco
Central, desde agosto de 2011, vem diminuindo a taxa de juros, com o objetivo
de estimular o consumo e facilitar a negociação de dívidas das grandes
empresas. Neste período, o crescimento do PIB caiu de 4,5% a 1% anualmente.
Nesse mesmo período (2006-2012), o tesouro nacional injetou R$ 390,1 bilhões no
BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. A taxa de investimentos veio
caindo nos últimos cinco trimestres (4% em 2012). A produção industrial caiu
12,9% nesse período, e pela primeira vez nos últimos dez anos a indústria
reclamou da queda na produção de automóveis. A rumorosa redução das tarifas de
energia deixou escondido que entre 1995 e 2011 ocorreu um aumento além de 455%
destas no custo ao consumidor, quando a inflação acumulou 234% no mesmo
período. Mais uma falácia, essa redução propagandeada de 16,2% na energia. Se
calcularmos os últimos 16 anos, o aumento das tarifas foi escandaloso. Os
grandes consumidores são subsidiados em 30%, beneficiando setores que usam
intensamente a energia (cimento, aço, ferro-liga, metais não ferrosos/alumínio,
química, papel e celulose). Dilma Roussef exalta os dez anos da gestão petista
e sua base aliada. Neste ufanismo, a presidente corre risco de assistir cair a
credibilidade no que propagandeia. Assim a presidente, centrada na reeleição,
cobra a lealdade dos partidos, anulando a tal faxina ética do início do governo
(trazendo de volta os demitidos). Não há limites éticos para o uso da máquina
pública e do orçamento fiscal brasileiro!
WALDIR BERTÚLIO